O Globo, 20/12/07
Demétrio Weber
Levantamento mostra que 19,9% dos brasileiros de 15 a 24 anos de idade não estudam nem trabalham
BRASÍLIA. Quase sete milhões de brasileiros de 15 a 24 anos, o equivalente a 19,9% da população nessa faixa etária, não estudam nem trabalham. É o que mostra relatório lançado ontem pela Rede de Informação Tecnológica Latino-Americana (Ritla). Segundo o estudo, menos da metade dos 34 milhões de jovens do país freqüentava a escola ou a universidade no ano passado.
Em 2005, mais jovens eram assassinados ou morriam em acidentes de trânsito do que no início da década, embora tenha havido redução nas taxas de homicídios em 2004 e 2005. No mesmo período, caíram as notas em português e matemática.
O Relatório de Desenvolvimento Juvenil cruza informações de educação, saúde e renda, para avaliar as condições de vida da juventude. O Distrito Federal ficou em primeiro lugar no ranking estadual, com Índice de Desenvolvimento Juvenil (IDJ) de 0,666, na escala até 1. O Rio de Janeiro ocupa a oitava posição, com 0,548 — acima da média nacional de 0,535 —, e Alagoas, a última, com 0,367.
Inspirado no Índice de Desenvolvimento Humano do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), que compara a qualidade de vida nos países, o IDJ restringe-se à realidade brasileira.
Jovens que não têm ocupação são os mais pobres
O sociólogo Julio Jacobo Waiselfisz, autor do estudo, acha preocupante que um em cada cinco jovens não vá à escola nem trabalhe. Em 2006, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) do IBGE, 29,3% dos jovens somente estudavam, enquanto outros 17,7% estudavam e trabalhavam. Ao todo, eram 46,9% na escola ou na faculdade — outros 33,1% só tinham emprego. Quem não fazia um coisa nem outra, tinha, em média, menos anos de estudo e menor renda familiar.
Ou seja, era mais pobre.
— É o círculo vicioso da pobreza — disse Julio Jacobo.
Citando pesquisas no Distrito Federal e em Pernambuco, Jacobo diz que esses adolescentes passam o dia na rua ou em bares, trilhando um caminho que invariavelmente leva à criminalidade.
Segundo o relatório, são 6,9 milhões no país. Ele lamentou que menos da metade dos jovens freqüente a escola. Pior: só 33,1% cursam o ensino médio ou superior, pois boa parte dos jovens ainda não terminou o ensino fundamental, por causa do abandono e da repetência.
Segundo o sociólogo, o maior drama, porém, é a falta de qualidade do ensino. A série histórica do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) do Ministério da Educação (MEC) mostra que, de 1995 a 2005, as notas de português e matemática caíram tanto na 8asérie (9º ano, onde o ensino fundamental dura nove anos) quanto no 3º no do ensino médio: — Jogamos pelo ralo três anos de estudo. É como se um aluno da 8asérie tivesse estudado apenas cinco anos.
Ele defendeu programas para dar mais acesso a computadores e internet. Hoje, mesmo na escola pública e nos centros gratuitos, os menos pobres são os que usam mais a informática.
O Rio ficou em último lugar no indicador de saúde, puxado pela mortalidade de jovens por causas violentas, em que também ocupa a última posição, com taxa de 130,7 mortes para cada cem mil jovens contra 79,3 na média nacional. O Maranhão tem a menor taxa de mortalidade por causas violentas, com 40,9. Em termos nacionais, a taxa de homicídios caiu na esteira do Estatuto do Desarmamento, mas vem aumentando o número de jovens mortos no trânsito.
Jacobo diz que a desigualdade de renda é uma das principais causas da violência. Ele lembrou que, no Rio, as favelas ficam dentro da cidade e que os jovens pobres se espelham no padrão de consumo da população com maior poder aquisitivo.
Jovens negros também têm piores indicadores.
Taxa de analfabetismo entre os jovens é baixa Nem tudo, no entanto, são más notícias. O analfabetismo entre os jovens era de 2,4%, concentrado no Nordeste. Em dez estados, não passava de 1%, caso do Rio. Em São Paulo, o melhor colocado, era de 0,7% e em Alagoas, o pior, de 8,2%. A taxa de jovens freqüentando o ensino médio ou a faculdade, como é previsto para quem tem 15 anos ou mais, subiu ligeiramente de 29,2% para 33,1%, entre 2001 e 2006.
O IDJ utiliza dados de 2005 e 2006 já divulgados pelo IBGE, o Ministério da Saúde e o MEC.
Do somatório de seis indicadores, nasce o índice. A renda é calculada com base no salário mínimo. Os aumentos acima da inflação, no entanto, distorceram o índice, impedindo comparações entre anos diferentes.
Esta é a terceira edição.
A primeira foi divulgada em 2003 e a segunda, em 2005.
O diretor-executivo da Ritla, Jorge Werthein, defendeu a adoção de políticas públicas duradouras nos três níveis de governo — União, estados e municípios — para enfrentar o problema: — Já temos todos os indicadores.
O que falta é uma política de longo prazo que não mude a cada quatro anos, com a troca dos governantes — disse Werthein.
“Jogamos pelo ralo três anos de estudo.
É como se um aluno da 8asérie tivesse estudado apenas cinco anos Julio Waiselfisz, autor do estudo Já temos todos os indicadores. O que falta é uma política de longo prazo que não mude a cada quatro anos Jorge Werthein, diretor da Ritla
No setor privado, porém, pouquíssimas, apenas 4,3%, são universidades. O censo mostrou que prevalece no país a pequena instituição de ensino superior: 67,5% têm até mil alunos matriculados.
Curso de educação à distância cresceu 571% em três anos O levantamento registrou ainda um grande crescimento nos cursos de educação à distância (EAD). De 2003 a 2006, houve um aumento de 571% em números de cursos e de 315% no número de matrículas.
Em 2005, os alunos de EAD representavam 2,6% do total de estudantes. Em 2006 passaram a ser 4,4%.
Segundo o presidente do (Inep), Reynaldo Fernandes, os números mostram que é preciso dar atenção ao ensino à distância, que teve mau desempenho no Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (Enade).
— Não dá mais para se tratar ensino à distância como algo residual. O Enade já havia mostrado que o desempenho desses alunos é o pior — disse Fernandes.